Há muitos detalhes interessantes que chamam a atenção quando uma leitura comparativa entre os quatro Evangelhos é realizada. Por exemplo:

[1] Marcos relata que na noite em que Jesus foi preso, no jardim do Getsêmani, "um dos circunstantes, sacando da espada, feriu o servo do sumo sacerdote e cortou-lhe a orelha" (14:47). Através de Mateus (26:51) e Lucas (22:49-50) descobrimos que esse "circunstante" era um dos discípulos que estavam com Jesus. Com João, descobrimos quem era o servo do sumo sacerdote (Malco) e qual dos discípulos cometeu o ato violento: Pedro (18:10).

[2] Marcos relata que na semana da traição e morte de Cristo, "uma mulher" trouxe um vaso de alabastro e derramou sobre a cabeça de Jesus um preciosíssimo perfume de nardo puro (14:3). Mateus traz a mesma informação que Marcos (26:7), mantendo a mulher anônima. Mais uma vez, é João quem revela ao público a identidade da personagem: Maria de Betânia, a irmã de Lázaro e Marta (12:1-3).

Se Marcos foi escrito entre as décadas de 40 e 50 d.C., Mateus e Lucas entre as décadas de 50 e 60 d.C. e João na década de 80 d.C., existe uma explicação bastante plausível para esse fenômeno: o que alguns estudiosos chamam de "anonimato protetor".

Por mais que Jesus tenha restaurado a orelha cortada de Malco, o ato foi uma violência que poderia ter acarretado consequências mortais (caso a espada tivesse ferido o homem na cabeça ou na garganta) e assim, Pedro estaria em perigo diante das autoridades. O anonimato na história serviu como uma ferramenta de proteção, uma estratégia de prudência para a segurança pessoal do apóstolo. Tendo Pedro sido morto por Nero na década de 60 d.C., João sentiu-se livre para relatar as informações faltantes.

Em relação à unção de Jesus por Maria de Betânia (um reconhecimento público de que ela o via como o Rei-Messias de Israel), essa mulher estaria em perigo se houvesse sido identificada como uma cúmplice nas alegações politicamente subversivas de realeza messiânica de Jesus. O perigo para ela poderia ser considerado ainda maior do que para o homem que cortou a orelha do servo do sumo sacerdote.

João nos fornece ainda uma outra chave importante sobre o porquê de os demais evangelistas não terem identificado Maria de Betânia em seus relatos. Ele nos informa que Lázaro, o irmão dela, estava jurado de morte pelas autoridades, por ser uma testemunha viva do poder de Jesus (12:10-11). Podemos inferir que, para a proteção de toda a família, os Evangelhos que circularam nas décadas anteriores não relataram nenhuma informação pessoal a respeito deles, por mais que fossem amigos bem próximos de Jesus. Quando a "poeira baixou" e os inimigos não estavam mais em cena, João mais uma vez forneceu o quadro completo da história.

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